sexta-feira, 17 de julho de 2020

Um ano sem minha avó

Hoje, dia 17 de julho de 2020, faz um ano que você nos deixou, vó. Um ano em que a sua casa não tem luzes acesas, não tem cores, não reúne essa família bagunçada, que você tanto queria por perto. 

Sabe, vó, eu me mudei, há 14 dias; sábado, dia 11, eu arrumei praticamente tudo no novo apartamento, inclusive aquela caixa de baralho, que o João saiu para comprar, num domingo que compartilhamos no outro apartamento. Ele sempre fala sobre a senhora, suas habilidades, especialmente as surras nas cartas, nas muitas vezes em que a jogatina corria solta...

Aquela cadeira foi parar na escrivaninha da Alícia, vó. Ficou tão linda, lá, queria poder receber a senhora aqui, e mostrar. Ah! o puxa-saco, aquele que ganhei logo que me casei, tá ali, penduradinho. Eu lavei quando chegamos aqui no novo apto. Meu cantinho do café tem aquela bandeja; sim, a que eu sempre amei, e depois da sua partida, veio para em cima justamente do aparador que a senhora me deu também quando casei.

A banqueta dele tá ali, de estofamento novo. O espelho da penteadeira, que eu namorei desde criança, e que era motivo de risada quando eu pedia pra mim, tá aqui. Confesso que ainda não mandei reparar... ele me traz alegria, porque nos aproxima, mas é igualmente uma prova de que seu reflexo, agora, ficou só nas minhas lembranças. 

Vó, desde que a pandemia começou, eu agradeço por Deus tê-la levado antes. Eu sinto que esse isolamento não lhe faria bem algum, porque a senhora era a rainha do táxi-amigo, tão independente, e ser proibida de sair de casa certamente seria uma tortura! Nem aquele cappuccino a gente poderia ir tomar, acredita? Nada de shopping, medo mais do que absurdo a cada sintoma que demandasse ida ao hospital... esse ano, vó, não teve almoço na Sexta-Feira Santa, nada de Dia das Mães, sem aniversários... 

Eu chorei muito, porque época junina era algo tão incrível na nossa família, né? A pamonha, a canjica, e claro, o melhor pé-de-moleque do mundo, que só a senhora sabia fazer. "-Com carimã, minha filha!" É uma tristeza que dói, vó, não ter mais essas coisas incríveis que a senhora fazia. 

Seus cadernos, suas histórias, eu ainda não tive coragem de enfrentar. Não sei se estou preparada para mergulhar fundo nesse mundo que a senhora criou, mas não está lá para me conduzir. Sei que vai chegar a hora, e eu prometo dividir com outras pessoas os seus escritos. 

[quase consigo vê-la, rindo de mim, balbuciando que eu sou
"uma menina besta", porque vou ler e quero dividir]

Eu não sei o que fazer com essa saudade, vó. Não quero chorar, porque ter nascido sua neta foi uma coisa mais do que incrível, foi extraordinária! Foram 38 anos de bolos bombocados, pasteizinhos, glacê de bolo, garrafa de chá na geladeira, pé-de-moleque, e, claro, farofa com café. É, aquela história que a senhora contava pra Deus e o mundo, sobre quando me flagrou, bem criança, com um copo de café e um pote de farofa, indo assistir TV na sala, numa tarde qualquer na sua casa. 

Queria ter tido maturidade para ter guardado os mini-cabides e as roupinhas de Barbie que a senhora fez pra mim! E todos os brinquedos que fizemos na sua casa, com material reciclado; ou as cabanas de acampamento no jardim, com histórias maravilhosas das suas experiências de vida. Os banhos de mangueira, o "pão-de-milho" com leite e açúcar, as roseiras, a dama-da-noite, quanta lembrança boa e tenho guardada em mim! Nossa foto - aquela, tirada no meu casamento - representa o quanto eu fui feliz, porque seu sorriso ali é tão genuíno! 

Ah, vó. Quanta saudade <3 nbsp="" p="">