"Enquanto dirigia sem rumo, alheia ao movimento - quase ligada no piloto-automático - ela revia mentalmente todos os equívocos que cometera; a consciência cobrava o alto preço pelas inúmeras vezes em que foi ignorada, em detrimento do que dizia o estúpido - e péssimo conselheiro - coração.
As cenas se repetiam, enquanto a sensação de estupidez sufocava a ponto de fechar-lhe as vias aéreas, enquanto as lágrimas irrompiam, lavando-lhe a face como uma negra cachoeira, provocada pela máscara que desprendia dos cílios. Ali, naqueles instantes, pouco importava a situação da maquiagem: em pior estado estava o interior. Este sim, negro, revirado, uma mistura de raiva, rancor, sangue e vísceras revolvidas.
Ao passo em que tudo o que foi dito reverberava, como que numa gravação em repetição interminável, ela podia sentir o gosto amargo da revolta. Nesse cenário - mente e alma em descompasso - lamuriou silenciosamente, pedindo que tudo não passasse de um pesadelo.
... eis que percebe ter chegado - Deus sabe como - sã e salva em casa. Como um afogado que luta desesperadamente para subir à tona, ela correu na direção de seus travesseiros, cúmplices de longos dias e noites de aflição.
Chorou em silêncio até dormir, certa de que o mundo seguiria eu curso, independentemente dos cacos espalhados pelo caminho."
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