terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

Divagando em contos VI

"Não havia outro meio, senão proteger-se tanto quanto possível, reunir equipamentos, fazer uma prece e partir para o deserto. Imbuída de coragem, entregou-se ao mar de areia, perseverante.
 
O sol a pino, o desconforto térmico, o peso das coisas materiais e emocionais. Sem trilha a seguir, deixou que seus instintos a guiassem; e assim, andou por horas rumo ao nada.
 
Ao cair da tarde, os ventos lufavam temores, quanto ela decidiu que era hora de se abrigar. Não demorou para que seus pesadelos se fizessem reais, em forma de tempestade. A crueldade da tempestade de areia é não permitir que se aja. É se proteger, rezar e esperar passar.
 
Encolhida em si mesma, permitiu que sua mente rodopiasse, organizando e desorganizando as certezas; do caos, é possível tirar algo de bom. E foi nesse momento que percebeu o quanto havia desafiado a si mesma, os riscos da empreitada, as inúmeras possibilidades de insucesso. Não temeu, havia uma certeza inabalável que a preenchia, ainda que alternasse instantes de dúvidas e impulsos de voltar atrás.
 
Porém, no meio do nada, não seria inteligente retornar; até porque seus passos já não existiam. O caminho seria árduo, então que o fosse rumo à frente, ao futuro. Sem saber direito se dormiu, se viveu ou sonhou, sacodiu a poeira, reuniu o que sobrou e partiu outra vez. 
 
A exemplo do dia anterior, o sol teimava em esquentar ideias e aferventar receios, fazendo pesar dolorosamente o corpo e a mente. Disposta a não desistir, lutou e prosseguiu. Foi seduzida por miragens, mas não se entregou, não blasfemou. Tinha consciência de que plasmara pensamentos, e por isso mesmo não podia culpar ninguém pelas ilusões que ela mesma criara.
 
Entre tropeços, quase desistências, tempestades mentais, emocionais e de areia, fome, sede, desespero e fé, vislumbrou um vulto de braços abertos... questionou-se, temeu, mas seguiu na direção do ser que sorria.
 
Impassível, o homem manteve seus braços e seu sorriso, transmitindo a ela a certeza de que a jornada não foi em vão, e o caminho adiante será de aprendizado e felicidade."

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